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Pessoas se tocam, se quebram, se destroem, se constroem em infinitas possibilidades de interação. E não há nada maior que essas interações que variam de temperatura, grau, gênero e intensidade. Às vezes duram, às vezes acabam no meio de uma frase insignificante. Mas elas duram dependendo do quanto nos acrescentaram e do quanto nos ensinaram. As filosofias taoistas dizem o tempo todo que o outro é o maior espelho no qual podemos nos refletir e, consequentemente, os maiores professores que nos ensinam sobre nós mesmos.

Eu quero é dizer sobre o modo automático que lidamos com o fim dessas relações que acabam abruptamente e como o período de luto assusta quem assiste o processo. O discurso pregado com louvor diz que “a dor de um antigo amor se cura com um novo”, há quem acredite fervorosamente nessa expressão. E nessa entramos em ciclos de relacionamentos caóticos que mais destroem do que curam.

Meu último relacionamento foi um rasgo no meu miocárdio. Nos sentíamos em sintonias diferentes e nossas estações nunca se encontraram realmente. Mas esse nunca foi o maior dos problemas. Antes dela, foi igual. E antes de antes dela, também. Vê? A nossa falta de assertividade, apesar do muito amor envolvido, me serviu como alerta para os traumas de relações que me machucaram igualmente ou mais. Correndo de um relacionamento para outro, não trabalhei a cura daqueles processos e deformações que relacionamentos e pessoas anteriores me causaram. Nunca respeitei o silêncio e a quietude necessários para me respeitar. Engatei em histórias diferentes com pessoas diferentes carregando bagagens pesadas de histórias mal-resolvidas. Nunca curei feridas que ainda estavam abertas, nunca limpei a sujeira que ficou, nunca me permiti sentir a saudade pelas brechas que ainda sobraram porque precisava não ser aquela jogada à própria sorte. Nunca organizei a alma para receber novas visitas. E hoje compreendo o erro abusivo que cometi contra mim mesma e as injustiças com quem permiti que me adentrasse nesses períodos de distorção e depreciação de mim mesma.

Hoje, se eu pudesse agradecê-la pelo amor que me deu, eu agradeceria e amaria de volta por uma vida inteira. Mas se existe algo que eu seja imensamente grata pelo relacionamento que tivemos e o amor ao qual nos dispomos a sentir, é pelo fim, que me obrigou a olhar para mim mesma e compreender que o que muito erramos e o que muito nos machucamos era apenas o reflexo dos nossos traumas e medos projetados ali, uma na outra. E me conceder uma possibilidade de mudança em mim e nas minhas atitudes me permitindo ser mais assertiva e reprogramar algumas crenças que se fincaram em mim por aquilo que não deixei se consumir e se purificar com o tempo entre um relacionamento e outro.

Hoje, experiencio o real significado de perdão no silêncio que faço sobre o que nós duas fomos em nove meses. Ainda que não compreenda como chegamos até ali, ainda que eu não saiba lidar com essas partes que não compreendo; ainda assim, eu sei que saí dessa história de forma honesta. Não saímos ilesas, mas espero que ela também saiba que, apesar dos pesares, continuamos sendo incríveis e suficientes mesmo que tenhamos dito e nos sentido o contrário. E, com o coração aberto, eu aprendi a me respeitar nesses períodos de luto e respeitá-la também porque o amor foi incrível, mas a lição que me deixou, ainda mais.

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